terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Apartamento 301

Acende a luz, a torneira está aberta. O banheiro está com infiltração. Tenho que ir ao supermercado, o IPTU vence hoje. Espera um pouco, esqueci a janela aberta. Fecha o registro de gás. Domingo meus pais vem me visitar.
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Quando me dei em conta, descobri que meu primeiro dia no apartamento era o Dia da Consciência Negra. Zumbi dos Palmares tornou-se o padroeiro da minha liberdade, responsabilidade. Quando cai em conta, descobri que meu vigésimo dia no apartamento era também o meu vigésimo sexto verão. Na verdade, descobri que não tinha sequer cortado ainda o cordão umbilical, mas tive a certeza que esta estação será diferente.
Afinal, a conta de luz virá mais cara!
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Estou naquele processo de adaptação como uma criança que acabara de mudar de escola. Onde fica o banheiro masculino? E o bebedouro? Colegas novos da nova escola. Vira a esquerda, depois a direita que você chega na Prefeito Botafogo. Ah, o shopping é logo ali. Ufa, não preciso ligar para avisar que vou chegar de madrugada.
Na verdade, sou um turista admirado com a vista da própria casa.
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Ah, a noite! Aprendi a devorar os livros empoeirados há anos na prateleira do quarto antigo. Fiquei mais falante, desinibido. Talvez seja porque escuto, agora, o silêncio. Ah, que saudade dos gritos estridente da minha mana mais velha, da mania de ordem da outra. Saudade da paciência irritante do meu pai e da eletricidade pacifica da minha mãe. Ah, já ai esquecendo: aprendi a colocar sleep na hora de dormir.
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(André Aquino)